DISTRIBUIÇÃO E NÚMERO

A presença de lobo na região que atualmente constitui Portugal Continental remonta a cerca de 150.000 (no Paleolítico médio)  anos atrás, tal como atestam os fósseis encontrados na Gruta da Furninha (Peniche), atribuídos a Canis lupus lunellensis, um lobo de menores dimensões que o atual, adaptado ao clima húmido e quente que na altura dominava na Península Ibérica. 

O lobo atual surge no registo fóssil de várias localidades portuguesas desde há 30.000 anos, período caracterizado por um clima mais frio. Nessa altura, a comunidade de grandes mamíferos onde o lobo se inseria era bastante mais diversificada do que a atual, incluindo várias espécies de predadores, como o urso, a hiena, o leopardo, o leão-das-cavernas e o lince-ibérico, assim como um leque variado de presas potenciais, como o javali, o veado, o gamo, o corço, a cabra-brava, a camurça, o auroque, várias espécies de equinos selvagens, o rinoceronte, o elefante e o mamute. Porém, a ação conjunta das alterações bioclimáticas e do crescente impacto do Homem a partir dos últimos milénios, levaram à progressiva extinção da maioria destas espécies, sendo o lobo a única exceção entre os grandes carnívoros.

Reconstituição de uma paisagem Ibérica durante o paleolitico, com um humano primitivo (em segundo plano à direita)
Ilustração: Mauricio Anton; https://mauricioanton.wordpress.com/

Desde o início da nacionalidade, no século XI, que existem várias referências escritas à grande abundância de lobos em Portugal.
No princípio do século XX era ainda possível encontrar o lobo em praticamente todo o território continental Português. Porém, nas primeiras décadas do século XX o lobo inicia uma acentuada regressão da sua distribuição, de Este para Oeste e de Sul para Norte, devido principalmente à destruição e fragmentação do habitat, da perseguição movida pelo Homem e ao declínio das suas presas silvestres. O processo de regressão foi lento até meados do século XX, sendo que ainda durante a década de 1950 o lobo existia praticamente em todo o país, nomeadamente no Algarve, no Alentejo e no vale do Tejo, a poucos quilómetros de Lisboa.

No entanto, a partir de 1960, o lobo sofre um rápido e contínuo processo de extinção na região sul, permanecendo apenas pequenos isolados populacionais, com reduzida viabilidade, associados às zonas de maior altitude e maioritariamente na região fronteiriça com Espanha (p.ex., serras algarvias, Serras de Portel e Barrancos, Serra de São Mamede). Em finais da década de 1980, o lobo extingue-se a sul do rio Tejo. Desde então, apenas sobrevive nas regiões mais recônditas e montanhosas a norte do rio Tejo. Nesta região, onde a distribuição do lobo tem um padrão mais contínuo, verifica-se um processo de regressão distinto, que se caracteriza por uma crescente regressão nas áreas de periferia, a sul e a oeste. 

A partir da década de 1990, a área de distribuição do lobo parece estabilizar, mantendo-se a espécie nas regiões mais montanhosas e remotas da metade norte do país, caracterizadas por uma menor densidade populacional humana e por uma importante atividade agropecuária tradicional. Hoje em dia, o lobo ocupa uma área restrita que corresponde a apenas 20% da extensão ocupada no princípio do século passado. 

Mapa da evolução do lobo-ibérico ao longo do século XX . Fonte: Petrucci-Fonseca (1990), Petrucci-Fonseca e Álvares (1997), Pimenta et al. (2005)

De acordo com o último censo nacional, realizado em 2002-2003, estima-se que existam cerca de 300 lobos em Portugal, distribuídos por um total de 63 alcateias , e ocupando uma área de aproximadamente 20.400 km2

A atual população lupina encontra-se fragmentada em dois núcleos que, apesar da sua proximidade geográfica, se encontram aparentemente separados pelo vale do rio Douro. 

A sul do rio Douro, a espécie sobrevive apenas nas Serras de Montemuro, Freita, Arada, Lapa, Leomil, Trancoso e na região fronteiriça de Almeida e Sabugal, estimando-se que existam menos de 40 indivíduos, distribuídos por 6 a 9 alcateias. Este núcleo tem vindo a demonstrar uma crescente instabilidade reprodutora e um elevado nível de fragmentação, estando aparentemente isolado do núcleo populacional situado a norte do rio Douro e da restante população Espanhola. Desta forma, a reduzida população Portuguesa de lobo que ocorre a sul do rio Douro parece evidenciar um eminente risco de extinção.

A norte do rio Douro, o lobo encontra condições de sobrevivência mais favoráveis, com os principais redutos da espécie situados nas serras do Alto Minho e de Trás-os-Montes, em particular as abrangidas pelo Parque Nacional da Peneda-Gerês e pelos Parques Naturais de Montesinho e do Alvão. A população que ocorre a norte do rio Douro, estimada em 45 a 54 alcateias, está conectada com a restante população lupina Espanhola e aparenta alguma estabilidade na sua área de ocorrência. 

Encontra-se em fase de conclusão o novo censo nacional de lobo realizado em 2019/2021, com coordenação do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, cujos principais resultados serão aqui apresentados, assim que estiverem disponíveis.

Mapa com alcateias confirmadas e prováveis em Portugal entre 2002 e 2019. Fontes: Álvares et al. (2015), Casimiro et al (2021), Pimenta et al. (2005)

Alcateia confirmada – onde foi confirmada a ocorrência de um grupo ou de reprodução, entre 2002 e 2019, de forma regular ou pontual.
Alcateia provável – onde não foi confirmada a ocorrência de um grupo ou de reprodução, entre 2002 e 2019, e a prospeção é considerada deficiente.

Fontes:
Álvares (2016) O lobo em Portugal: uma perspectiva histórica. In: Cosme. No Trilho do Lobo. ACHLI. Álvares et al. (2015) Situação de referência para o Plano de Ação para a Conservação do Lobo-ibérico em Portugal. ICNF/CIBIO-INBIO/CE3C/UA.
Cardoso (1993) Contribuição para o conhecimento dos grandes mamíferos do Plistocénico Superior de Portugal. Câmara Municipal de Oeiras.
Casimiro et al. (2021) Investigação aplicada à conservação do lobo no Noroeste de Portugal: Plano de monitorização do lobo no âmbito do sobreequipamento dos Parques Eólicos do Alto Minho I e de Arga. Relatório Técnico. CIBIO/InBIO.
Petrucci-Fonseca (1990) O lobo (Canis lupus signatus Cabrera, 1907) em Portugal: problemática da sua conservação. Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
Petrucci-Fonseca & Álvares (1997) Evolução histórica da distribuição e análise da situação actual do lobo na metade sul de Portugal. II Jornadas sobre el Lobo mediterráneo.
Pimenta et al. (2005) Situação Populacional do Lobo em Portugal: resultados do Censo Nacional 2002/2003. Instituto da Conservação da Natureza/Grupo Lobo. Acedido 15 dezembro de 2022
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